sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ALTO-RETRATO DE NANE TAMANCA


ALTO-RETRATO
Caderno (Porca)MaDonna!
Jornal O Polenteiro – Terra da Cocanha
(Com cópia na edição deste domingo do Prima Hora)
Joanim Pepperoni, PhD, entrevista Nane Tamanca

1. Qual sua lembrança de infância mais remota?
A Mama molhando a chupeta no molho de perdizes e contando histórias dos antepassados, do Sanguanel, do L’uomo Polentus e do Vechio do Milharal.

2. Qual seu maior ídolo na adolescência?
A Madonna e a Caspicciolina.

3. Onde passou suas férias inesquecíveis?
Num chalé na orla do Tegão. Tinha pilão, monjolo, arapucas, moinho... Mas o inesquecível foram os passeios de gôndola pelas doces águas do Tegão, a paisagem ribeirinha repleta de hortas de radicci e milharais. Tudo incrivelmente verde e produtivo!

4. Qual sua ideia de um domingo perfeito?
Acordar os galos, revistar as arapucas no Parque dos Miquinhos, ir à missa, almoçar na casa da Nona (que faz uma polenta divina), tirar uma sesta, jogar bocha ou baralho, ir ao estádio do Polentude e vê-lo derrotar o S.E.R. Colono. Se sobrar tempo, ir pescar no Tegão ou quebrar milho ou ainda exercitar o braço no pilão.

5. O que você faz para espantar a tristeza?
Geralmente procuro rir por conta própria ou contar piadas - que aqui na Terra da Cocanha ninguém entende (geralmente só se ri da desgraça do vizinho), porque a ambiguidade é confundida com a umbiguidade pessoal e aí sempre dá briga. Tristeza se espanta filando o almoço na casa de alguém, bestemando ou trabalhando.

6. Que som acalma você?
O som do pilão, do monjolo ou das mós do moinho. Um outro som que me apazigua a alma é o da méscola mexendo ritmadamente o guisado de água, sal e farinha de milho, com a polenta enfim se desgrudando do fundo da panela. Quando estou com fome, fico muito nervoso.

7. O que dispara seu lado consumista?
Quase nada. Mas há alguns dias cometi uma luxúria: ouvi falar do novo Stuzzicadenti (o méscolito) e fui correndo na loja do Giannini barganhar o preço com o vendedor.

8. Qual a palavra mais bonita do idioma Polentalião?
Polenta-com-pissacàn-fiorim-lavoro-porco-dio-e-porca-madonna.

9. Que livro você mais cita?
O livro de receitas da minha Nona e o Manual de Operações do Monjolo importado da USA.

10. Que filme você sempre quer rever?
O épico “A guerra da polenta”, do diretor Rossellini Antonioni De Sica Pasolini Fellini, com os atores Marmelo Mastromilho e Caspicciolina.

11. Que música não sai da sua cabeça?
O clássico “La bella polenta”, interpretado por The Rolling Spigas.

12. Um gosto inusitado.
Polenta com molho de mortadela.

13. Um hábito de que você não abre mão.
Filar o almoço na casa da Nona aos domingos e andar com o Chevette na banguela pra economizar gasolina.

14. Um hábito de que você quer se libertar.
Em noites de lua cheia, colocar um disco de polenta na soleira da porta para o Sanguanel não invadir a cozinha e quebrar tudo. Puro desperdício!

15. Um elogio inesquecível.
Quando Saul Sultão me disse que eu tinha nascido pra bater pilão. Aquilo me emocionou muito...

16. Em que situação vale a pena mentir?
Especialmente quando se está fazendo uma negociação.

17. Em que situação você perde a elegância?
Quando tenho que sair de casa, ir à missa, por exemplo, sem as minhas tamancas ou botinas.

18. Em que outra profissão consegue se imaginar?
Em qualquer uma, pois um bom cocanhês mexe com qualquer coisa.

19. O que você estará fazendo daqui a dez anos?
Sessenta anos de idade.

20. Eu sou...
... o Nane Tamanca: tenho dupla cidadania (cocanhesa e paphlagônica) e bastante dinheiro guardado na poupança; sou pai de 18 filhos e meio, dono de um moinho com 1000 empregados, pago a anuidade da igreja em dia, tenho uma tulha permanente na Festa da Saúva, sou sócio do Polentary local... Precisa citar tudo? (risos)



quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

A TECNOLOGIA DO STUZZICADENTI

Que os cocanheses (nativos da Terra da Cocanha) obram milagres na Nanetecnologia é fato alargado no mundo inteiro. Entre incontáveis maravilhas já catalogadas por nossos pesquisadores, relatamos hoje a invenção do Palito de Dentes Nanetech, que se operou, segundo uns, por fruto do acaso, mas, conforme outros, por providência divina.
O primeiro palito de dentes da história da humanidade foi usado pelos ancestrais paphlagônios que habitavam as escuras cavernas da costa do Mediterrâneo, ainda antes da descoberta do fogo. Esses cavernídeos utilizavam garras de animais, espinhaços de peixes, pêlos de porcos e outros objetos pontiagudos para extrair as sobras de carne de perdiz alojadas entre os dentes, porque a etiqueta primitiva já proibia que se fizessem ruidosos movimentos de sucção (schhiiisch!... ou pfi!pfi!pfi!...).
Na Era della Pietra Lascata, os artesãos paphlagônios tentavam lascar pedras, para que ganhassem a forma de gravetos que pudessem ser usados na profilaxia dental. Na Era della Pietra Polita, as lascas de pedra eram cuidadosamente lixadas, mas a relação custo + tempo + benefício tornava inviável o uso dos “pedritos” como dentifrício interdental (os dentes apodreciam e caíam antes mesmo que alguém pudesse assenhorar-se de um “pedrito”). Conhecida, em razão disso, como “Civilização dos Banguelas”, os paphlagônios desenvolveram o mingauzinho de polenta, cujo consumo não exigia uso dos dentes (além de que todas as espécies ovíparas já haviam sido extintas).
Com a migração em massa dos paphlagônios para a Terra da Cocanha, na Era dos Milhonis Granulorum Moídos nel Piloni et Mangiatto cun Molhus de Perdigonis, teve início a até hoje reconhecida pesquisa científica para o desenvolvimento dos palitos de dentes. A abundância de aves silvestres na dieta cocanhesa exigia uma tecnologia para limpeza dental.
Os palitos pioneiros vinham em forma de rústico graveto pontiagudo acoplado no cabo da méscola de mexer polenta e era de uso coletivo, começando pelo patriarca e terminando nos bambini (as mulheres não tinham direito a “espalitar” os dentes). Operação excessivamente demorada, os nanetecnólogos tentaram então desenvolver “méscolitos” individuais, um investimento de saída malfadado, porque a tradição econômica cocanhesa não suportava tais luxos materiais.
É provável que neste ponto dos acontecimentos termine a História e comecem as especulações míticas. Conta-se que os palitos individualizados foram descobertos pela Nona do Nane Tamanca, mas coube a este último a sua produção e comercialização em larga escala. Depois de espatifar a méscola na cabeça do Nono, que safadamente ergueu a saia da Nona enquanto esta mourejava na panela de polenta, inúmeros gravetos foram encontrados no guisado polentáceo durante o filó noturno.
Deslumbrado, o Nane Tamanca patenteou a descoberta e passou a quebrar méscolas para fabricar os tais “méscolitos” de segunda geração. O problema maior residia na contratação de funcionários dispostos a dar sua cabeça às pancadas (da Nona, obviamente, pois só ela conhecia a técnica da batida certeira), além de que o Sindicato Comunista exigia indenizações milionárias para operários com traumatismo craniano. Essa técnica de produção nanefiatiana teve vida curta, mas contribuiu para a pesquisa do palito de dentes e foi definitiva para a fixação de um novo e apreciado ditado cocanhês: “Cada cabeça uma méscola!”